23 de fev. de 2012

Entrevista com Daniel Radcliffe pelo Jornal O Estado de Sao Paulo

Nos últimos cinco anos, além de completar a série Harry Potter, você fez o filme australiano December Boys, as temporadas de Equus em Londres e Nova York, um ano inteiro do musical na Broadway, além de participações especiais em programas de TV, tanto na Inglaterra como nos Estados Unidos. E, claro, filmou A Mulher de Preto. Teve tempo para dormir?
Durmo enquanto ando (risos). Ou ando quando durmo, talvez… Tem sido um período muito, muito ocupado, sem dúvida! Faz mais de três anos que tirei três semanas seguidas de folga… Estou cansado… Depois da estréia e promoção de A Mulher de Preto, posso descansar. Vai ser ótimo! Mas eu gosto de trabalhar, sabe? Gosto do meu trabalho, tudo o que sei é trabalhar e, sem fazer nada, fico logo entediado. E agora eu tenho disposição, tenho vontade, a ambição. Então, vamos lá!

Você vem trabalhando em papéis totalmente diferentes e quase ao mesmo tempo. É um expurgo, uma dissociação proposital do personagem Harry Potter?
Depois de trabalhar com um personagem por dez anos, ao sair daquele mundo de repente a gente quer fazer a maior variedade possível de papéis em que possa pôr as mãos. Agora estou ávido nessa busca e, quanto mais diferentes em idade e características eles sejam, melhor!

Você começou a filmar A Mulher de Preto ao mesmo tempo em que ensaiava o papel principal no musical How to Succeed. Chegou a fazer as duas coisas ao mesmo tempo?
Os ensaios eram nos finais de semana. Aquele período foi mais de preparação, com aulas e treinamento para dançar e cantar, além de decorar as falas. Era trabalho duro no cinema durante a semana e... trabalho duro no teatro nos fins de semana! Na produção de um espetáculo de teatro, o período mais pesado são as primeiras dez semanas. A parte dos ensaios, de umas quatro semanas em média, é provavelmente a mais gostosa para o ator. Depois há pelo menos duas semanas de ensaios técnicos, que é o mais difícil em qualquer trabalho, e, em seguida, as prévias onde, enquanto fazemos apresentações noturnas, continuamos ensaiando durante o dia. Aí é duro mesmo... Depois da estreia, fazer oito espetáculos por semana, de certa forma, fica fácil e é muito bom!

Houve coincidência entre as filmagens de A Mulher de Preto na Inglaterra e os ensaios do musical em Nova York?
Filmamos de meados de setembro até início de dezembro de 2010 e as apresentações prévias de How to Succeed começaram no fim de fevereiro de 2011. Gosto de trabalhar bastante e misturar teatro com cinema é ótimo. Ficamos praticamente um ano em cartaz com o musical, que para mim foi um verdadeiro desafio. Aprendi muito sobre mim mesmo, assim como aprendi muito como ator.

Como foi ter que aprender a dançar e cantar?
Foi realmente muito divertido! Nunca pensei que gostaria tanto! Quando tive minha primeira lição de dança, pensei: "Ô, droga.... Vou odiar isso, sou péssimo nisso." Mas, como alguém me disse: "Se você dedicar algumas horas em alguma coisa, vai ver como melhora". Eu pus muitas horas de trabalho e agora danço muito bem! É prova de que trabalhar duro compensa. Estou muito orgulhoso porque não deixei de fazer nenhuma apresentação.

Conta-se que você não quis ver nenhuma gravação da peça nem o filme Equus antes de fazer o papel de Alan Strang, em 2007. O livro A Mulher de Preto, de Susan Hill, foi adaptado para a TV britânica em 1989, teve duas adaptações feitas pela Rádio BBC, em 1993 e 2004, e, como peça teatral, é a segunda há mais tempo em cartaz continuamente em Londres, desde 1989. Você viu ou ouviu alguma dessas adaptações?
Não, nenhuma delas. Eu li o livro, claro.

E por que não?
Por nenhuma outra razão a não ser a de que sei que gosto de imitar e, mesmo sem intenção, se vejo alguém fazendo algo de um certo jeito provavelmente vou imitar. Por esse mesmo motivo não vi a versão de How to Succeed para o cinema enquanto estava me preparando para fazer a peça, não queria ser influenciado.

Você começou cedo numa profissão em que precisa dominar técnicas diferentes, para palco e para cinema. Como é que afia essas ferramentas?
Não tenho tantas quanto ainda posso ter, por isso faço aulas individuais com professores do Royal Court Theatre e também da Royal Shakespeare Company. Comecei depois do quinto filme da série Harry Potter, quando ia fazer Equus e queria trabalhar minha voz no palco, aprender a projetá-la. Treinando técnicas de voz, comecei também a aprender técnicas de atuação criadas por Meisner e foi muito, muito bom porque, até então, nunca tinha tido nenhum treinamento mesmo como ator. Tenho dez anos de experiência em cinema - o que é ótimo! - mas atores da minha idade, que estão saindo da escola de arte dramática, já fizeram tudo isso - aulas de voz, de interpretação, de dança - que preciso para ser completo.

Tanto o jovem atormentado de Equus quanto Arthur Kipps, em A Mulher de Preto, têm questões psicológicas diferentes dos problemas que Harry Potter solucionaria com mágica. Como você delineou internamente os personagens para desenvolvê-los sem ajuda de efeitos especiais?
Arthur não é nem de perto perturbado e psicótico como o Alan de Equus. Mas ambos compartilham de solidão e de um sentimento de injustiça e afastamento da sociedade. Alan cegava cavalos e provavelmente seria capaz de fazer mal tanto a si mesmo como a outras pessoas; Arthur é capaz de fazer mal só a si mesmo, como parece que faria já na primeira cena em que aparece, enquanto se barbeia.

Arthur é mais velho que você, é pai, é seu primeiro personagem adulto. O que o ajudou a interpretá-lo?
Música tem um papel importante para mim. Ouvir música me dá o tom de uma cena. Para este filme, andei ouvindo Micah P. Hinson and the Gospel of Progress, de Hinson. O interessante é que as músicas do disco não eram particularmente relacionadas com o filme... Ouvi muito esse álbum em 2009, durante um período que foi bem negro para mim... Ele trouxe de volta a sensação de um tempo em que me sentia uma pessoa sombria...

Que período foi esse, o que estava acontecendo?
Quando eu tive problemas com bebida... No fim daquela época, mais ou menos entre meus 18 e 19 anos de idade, foi quando ouvi aquele disco pela primeira vez. E voltei a ouvir quando estava fazendo o filme, não tinha feito isso desde então… Talvez seja uma coisa masculina, não sei, mas se entro numa sala e sinto que alguém está usando o perfume da minha namorada isso imediatamente me dá uma forte sensação de paixão. É a mesma coisa com música. Músicas e cheiros me trazem sensações e memórias.

Então isso é parte do seu método como ator?
Acho que sim. Nunca tive realmente um método além do próprio trabalho. Quando faço um filme, me baseio principalmente no texto, gosto muito de diálogos, das palavras, da linguagem. Uma das coisas mais interessantes para mim neste filme é uma sequência de quase 20 minutos sem diálogo. Ter que me comunicar sem verbalização foi muito estimulante e diferente para mim como ator. Gostei muito!

Depois das experiências tão diferentes de Equus e How to Succeed, o que você gostaria de fazer em teatro?
Fazer uma peça nova, inédita, não importa que seja tragédia ou comédia.

E no cinema?
Espero fazer alguns filmes. Já tenho dois roteiros. Como são filmes independentes, eles dependem de dinheiro...

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